Existe o fracasso da educação pública, e existem causas.

O fracasso da educação pública é algo assimilado pela opinião pública brasileira. É como falar sobre a corrupção na política. Admite-se, mas não se enxergam causas nem soluções. É mais um mal da sociedade brasileira que, grosso modo, nem adiantaria trazer para a discussão. Poderia ser mais um tema para humorísticos e discursos de palanque, mas o brasileiro não quer se envolver no problema. Rende reportagens na televisão, denúncias na imprensa, mas não é algo que tire o sono daquele que frequenta uma escola ou manda seu filho passar horas diárias em uma delas. Nada além de mais uma fraqueza do país.
Existe uma vasta bibliografia sobre o fracasso da escola pública. Mas que é feita para educadores preocupados com currículos e metodologias. Na verdade, é um diálogo que se efetiva apenas no meio acadêmico. E que acaba influenciando decisões políticas. Estatísticas, avaliações institucionais. No entanto, quem trabalha ou trabalhou na escola pública e, além disso, estudou nela, sabe que as causas de seu fracasso se evidenciam nas ações cotidianas ali praticadas. Há inúmeros culpados. Diretores, professores, alunos, pais, pedagogos, burocratas.
Existe uma máscara encobrindo as causas desse fracasso. E que encobre soluções que ultrapassem os âmbitos curricular e metodológico, com todos os recursos físicos que estes envolvem. A máscara cria falsos mitos para encobrir os verdadeiros culpados. Ela erige falsos mártires. Transforma em vítimas aqueles que são imediatamente culpados pelas ações que levam ao fracasso. E que insistem nessas ações.
Não há dúvida: as causas são muitas. Vão desde a aula mal dada à aula nunca dada. Entre uma e outra, a máscara é construída por todos que estão envolvidos no processo educacional. E atrás dela existe um mundo inacreditável, que a imprensa não denuncia, que o acadêmico não coloca em suas pesquisas, que a autoridade finge não perceber, e que existe porque inúmeras pessoas ganham com esse fracasso. E são ganhos de inúmeros tipos.
Por que não falar sobre isso? Mas falar do ponto de vista de alguém que presenciou cada uma das causas desse fracasso aqui apontadas. Desde a vida como aluno até o trabalho como professor e pesquisador. Alguém que estranhou a probição que recai sobre essa discussão. E que passou a ver a própria discussão oficial sobre o assunto como uma máscara. Dizer que a escola ganhou um computador ou que não o possui é só uma forma de não se dizer que o instrumento vai ser usado para burlar o processo pedagógico. Mas, quem o disser estará fora da dança de quadrilha que é o debate sobre educação, não formará um trenzinho nem girará no círculo daqueles que se envolvem no assunto.
É preciso ter a coragem de dizer: na educação pública acontece isso, acontece aquilo, e tudo isso gera o inevitável: o fracasso. Que nenhum dos programas oficiais voltados para a melhoria do ensino público vai conseguir vencer. Tal como a escola pública acontece hoje, ela só poderá acabar em falência completa.

terça-feira, 29 de maio de 2012

Apenas 10 cidades. O que esperar da escola paranaense?

Quem der uma olhadinha no site "Todos pela Educação" vai lembrar que existem cinco metas para a escola cumprir, no Brasil, até 2022. Nada de extraordinário. Na verdade, coisas tão óbvias como o aluno dominar o conteúdo da série em que estuda. No Brasil, apenas 25% dos alunos têm as habilidades exigidas para a série que cursam. Quem lê essas coisas pensa que o filho estudante integra esse grupo, ou que seu aluno está inserido nesse percentual. Quem leciona disciplinas práticas, como português e matemática, sabe que talvez nem se chegue a esses 25%.
A revista "Veja" publicou, há algumas edições, uma reportagem sobre as escolas de Minas Gerais que estão conseguindo cumprir essas cinco metas. No Paraná, dos quase quatrocentos municípios, apenas dez estão cumprindo. Cidades poderosas, abastadas? Gente de origem europeia, acostumada a ler? Nada disso. Dez cidades pequenas, algumas até com menos de dez mil habitantes. Algumas, com um pouco mais. Algumas localizadas em regiões de difícil acesso, através de rodovias sucateadas. Mas, elas estão cumprindo as cinco metas. Apenas cinco. Gente que não tem livros em casa. Metas como a de fazer o aluno que está há três anos na escola saber ler e escrever. Como é de praxe, os alunos têm um desempenho razoável nos primeiros anos do ensino fundamental. Depois, quando entram para a escola estadual, o nível cai. Dez, quinze pontos nas avaliações.
O pior é que, quem já conviveu com aluno saído de uma dessas escolas que estão dentro do esperado, sabe que o nível é fraco. Já tive alunos vindos de uma dessas escolas. Era inaceitável ver que o aluno estava muito abaixo do esperado, exigindo acompanhamentos mais cuidadosos. Não eram plenamente alfabetizados na sétima série. Fica difícil acreditar que essas escolas constroem qualidade. Tantas vezes, elas erradicam a evasão e a repetência, e conseguem números altos nas avaliações. Mas, quanto às habilidades, é duvidoso. A Prova Brasil, por exemplo, preocupa-se com quatro habilidades, não avalia a escrita. É ligeira e superficial.
Amanhã começa o SIELP, na Universidade Federal de Uberlândia. Inscrevi um trabalho em que comparo a falta de habilidades de alunos de escolas de regiões pobres de Curitiba com a mesma falta de habilidades de alunos de regiões ricas. Não há que se culpar a pobreza, as crises familiares, a qualidade de vida. Na maioria dos casos que analisei, o aluno de regiões pobres tem mais habilidades que o das escolas consideradas modelos. Tudo é apenas uma questão de currículo: quanto mais científico e próximo das propostas curriculares oficiais o currículo adotado, mais o aluno domina conceitos básicos.
No entanto, o esforço da escola pública daqui, deste estado com apenas dez cidades cumprindo metas, é para que tudo que se discuta nesses eventos, com pessoas da Suíça, da França, seja escondido e visto como falta do que fazer. Tal como as propostas curriculares, que as escolas escondem, ou proíbem que o prfessor adote. Para elas, é uma necessidade apoiar-se mais nos chavões construídos há décadas, que no conhecimento científico, empírico. Estatísticas, dados, como os da organização "Todos pela Educação", merecem apenas o descaso e o deboche das escolas. Todos acreditam que já estão em 2022 com as metas cumpridas.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

A falsificação das propostas curriculares de literatura: um exemplo curitibano


Há uma semana, discutiam-se em Porto Alegre os rumos do ensino de literatura infantil nas escolas. Um congresso reunindo pessoas de vários países. Deve parecer estranho a pessoas de países como Argentina e Portugal que não exista, no Brasil, um ensino de literatura organizado. Elas não sabem que existem propostas sérias neste sentido.

No começo deste mês, conversando com um antigo aluno, que mudou para Portugal, foi uma grata surpresa ver que ele sabe exatamente em que canto de Os lusíadas existe uma referência à cidade em que mora. Da mesma forma, outro ex-aluno, que migrou para a França no começo de 2011, mesmo estudando em uma sala especial para imigrantes,  conhece nomes de autores franceses e suas obras. É um aluno de sexta série.

No Brasil, existe a prática de não se trabalhar com a literatura, mas apenas com fatos da história literária, resumidos em datas e nomes. Pior que isso, os autores de que se fala são colocados na condição de relevantes pela qualidade, e um livro notoriamente ruim, como A escrava Isaura, é focalizado como se se tratasse de obra meritória. O professor não pede a leitura de livros assim com a intenção de focalizar o fenômeno literário, mas apenas como uma obrigação curricular. E o aluno sai da aula sem entender por que existe literatura no currículo.

A literatura infantil segue passos semelhantes. Ela é vista apenas como fruição, entretenimento que a criança pode trocar por um desenho animado e ganhar em velocidade e quantidade de informação. A professora primária, que não faz a menor ideia do que seja o fenômeno estético, incentiva a leitura como um meio para se chegar a um fim pragmático: melhorar a ortografia e, novamente, o incremento do senso crítico, que ela mesma não possui.

As grandes autoridades no ensino de literatura infantil lamentam que a escola ainda disponibilize obras como as da Série Vaga-lume, e que autores como Marcos Rey e Maria José Dupré sejam vistos como leituras recomendadas. Marisa Lajolo ainda fala com preocupação do atrelamento da literatura a interesses de natureza moralizante. Um livro passa a ser visto como bom porque focaliza assuntos relacionados ao universo escolar, como cidadania, negritude, ou aos eternos mitos de uma cultura empolada. Regina Zilbermann insiste no fato de a escola desatrelar a leitura da formação de leitores proficientes, e lamenta que a escola recorra a fichas de resumos, a quantidades de livros e a avaliações. A cultura brasileira do toma-lá-da-cá, que se converte em sistema de avaliação, conforme afirmam as Diretrizes Curriculares Estaduais de Língua Portuguesa, acaba fazendo da leitura mais uma obrigação que o aluno troca por nota, sem nunca chegar a compreender de que se trata.

E, no entanto, as propostas curriculares em vigor procuram o contrário dessas práticas. Os Parâmetros Curriculares Nacionais, escritos por pessoas que certamente leram Dante, Cervantes, Joyce e Faulkner, entre outros, afirmam que a finalidade do ensino de literatura é a formação estética. Formação que rompa com os modelos criados pela indústria dos livros. Ou seja, essa proposta retoma preocupações da Escola de Frankfurt, de filósofos como Adorno e Benjamin, que viam na produção de uma arte industrial uma das grandes ameaças à formação integral da pessoa. Como “produto espúrio do capitalismo”, para usar a expressão de um conhecido crítico, existe o best-seller, que não corresponde a nenhuma literatura, mas apenas aos produtos de uma indústria cultural. A preocupação dos Parâmetros Curriculares Nacionais é formar pessoas que conheçam a Arte, e que saibam diferenciar a obra de arte de valor das produções dessa indústria. A literatura passa a ver vista em sua condição de Arte, não mais de história a ser decorada. E o aluno deve ler obras de valor, para poder saber que os produtos dessa indústria não podem ser vistos como elaborados por artistas. São produtos sem valor estético.

As Diretrizes Curriculares Estaduais do Paraná também fazem dessa formação de leitores proficientes sua intenção norteadora. A literatura não é para ser vista como um conjunto de fatos, nem deve ser cobrada como uma obrigação a ser cumprida. Os autores da proposta sabem que os grandes escritores estão entre os maiores homens que a humanidade produziu, e suas obras não precisam ser trocadas por notas. A questão é tornar o aluno capaz de ver a grandeza da arte literária. E ver, consequentemente, o que é medíocre como tal. Primeiramente, a proposta de 2006 adota a perspectiva rizomática como forma de abordagem dos textos literários. Uma leitura deve induzir a outra, sem preocupação com uma visão diacrônica. No entanto, essa perspectiva traz de volta o perigo de se fazer da literatura um pretexto para se falar de novo sobre temas escolhidos a dedo, como se a obra literária precisasse tratar de temas ou representar uma visão politicamente correta. Matava-se a Arte em nome de coisas com as quais ela não tem que se preocupar. A Arte é transgressora, não é serva de convenções sociais. E a grande arte costuma causar escândalo e desconforto. 

Em 2008, quando as Diretrizes Curriculares Estaduais assumem as preocupações metodológicas da Estética da Recepção, e faz de autores como Jauss e Iser os fundamentos de sua concepção de literatura, houve o passo definitivo para que a escola paranaense pudesse tratar a literatura como ela merece, sem concessões a ideais políticos ou a modelos fracassados de avaliação. As obras devem ser abordadas como fenômeno estético. Este fenômeno possui especificidades, e são elas que o professor de literatura ensina: o que faz do texto literário uma obra de arte, como interagir com cada obra, vendo nela algo único. Na definição de Iser, cada obra é um jogo com regras próprias. A aceitação ou não dessas regras é que possibilita a interação entre obra e leitor. Só a compreensão dessas especificidades pode gerar o leitor-modelo, de que fala Umberto Eco. Conhecer as regras de cada obra para poder jogar, como quer Iser.

Quando o Núcleo de Educação me pedia que desse capacitações aos professores de Língua Portuguesa e Literatura, em eventos como o NRE-Itinerante, a preocupação dos organizadores recaía sobre a falta de conhecimento dos professores acerca da literatura em si. E isso era facilmente constatável: o professor que dá aulas sobre Machado de Assis nunca leu Sterne; não sabe que só existe Rosa porque antes existiu Joyce; da mesma forma, diante de um filme para ser visto em seus efeitos estéticos, como Vidas secas, atenta apenas para o enredo, mas nunca para a fábula.

Usando os termos do formalismo russo, é preciso que professores e alunos reconheçam que a arte literária visa ao efeito estético, jogo com regras próprias, e que estas são a fábula. O enredo é simplesmente o assunto, a narrativa. Esta não é o objetivo da literatura, como os ciprestes não são o interesse da pintura de Van Gogh, mas o pretexto para sua experimentação estética. O leitor-modelo atenta para a fábula; o leitor que não sabe do que se trata o fenômeno estético atenta para o enredo e só.

Por isso, o lixo da indústria cultural contém enredo sem fábula. Nenhuma elaboração estética, apenas as regras que o receptor conhece. O best-seller é assim; o cinema comercial; as pinturas compradas na loja de presentes. E é função da escola formar o aluno para que ele diferencie uma coisa da outra. Seu gosto pode até ser péssimo; mas seu juízo tem que fazer distinções objetivas.

Choca, é motivo de imensa indignação quando as escolas insistem em permanecer na década de 70, e fazer da leitura apenas a fruição de enredos que distraiam o leitor, ou que melhorem suas habilidades ortográficas. Hoje, isto é incrementado por uma preocupação com a leitura que sirva como pretexto para discussões ideológicas. O pior é quando tudo é agravado pelo obscurecimento do que seja literatura, o que traz consigo o ato de esconder as obras literárias. Em troca, o aluno tem diante de si o lixo da indústria cultura, o kitsch em sua dimensão mais espúria, pois necessita de engodos e mistificações para sobreviver. A leitura de porcarias da produção editorial internacional, sem nenhum valor estético, é vista como uma conquista por pessoas que nunca em sua vida se aproximaram da literatura efetiva, ou souberam do que se trata. As escolas trazem de volta a preocupação com a quantidade de livros, criam fichas de avaliação, resumos, ou mistificações grosseiras.

Tenho aqui em minha frente dois cadernos de resumos feitos por alunos da Escola Estadual Ângelo Trevisan, de Curitiba. Esses resumos correspondem a um modo de a escola checar se o aluno leu o livro. Seguem um formato que é, na verdade, uma tentativa de mistificar o gênero textual resenha: dados técnicos, resumo, apreciação crítica. É risível ver alunos, em pleno século XXI, depois de três propostas curriculares sérias, fazendo resumos de livros técnicos sobre aves e dinossauros, daqueles que se compram em bancas de revistas, e considerando-os como obras literárias. Mais que a incompreensão do aluno, choca a incompreensão do professor, que exige em cada resumo uma tipologia de personagens, como protagonista e antagonista, como se fossem categorias literárias. Exclui da literatura o lírico, o ensaístico, a memória. Autores como Italo Calvino e Borges. O aluno que leu um livro científico, mesmo infantil, sobre dinossauros, coloca-se na obrigação de dizer quem são o protagonista e o antagonista do que leu. Mais ainda, o aluno que não dispõe nem sequer do conceito de literatura é colocado para julgar as obras. Ele não sabe que o juízo contido em uma resenha é de valor, e não de gosto, um juízo técnico, que exige preparo. Nunca possuirá esse juízo, pois a referida escola esconde as obras literárias e disponibiliza aos alunos os produtos da indústria cultural. Precisará criar essa condição fora da escola. O aluno vive cercado por bruxos e dragões, mas nunca por obras literárias. O mais estranho é que não se encontram obras como as que o governo federal incluiu em seus programas de incentivo à leitura. Entra-se nas bibliotecas escolares em geral, e lá estão centenas de volumes de inegável valor literário. Os textos que os entendidos separaram para o aluno ler são obras literárias. O aluno encontra os clássicos, e também os modernos. Pode ler desde a poesia de Cecília Meireles até a de Manoel de Barros; desde os contos machadianos à dramaturgia de Ariano Suassuna. Mas na biblioteca da Escola Ângelo Trevisan há apenas dois ou três volumes do que é uma coleção com dezenas de títulos, vinte volumes para cada um. E que preenchem bibliotecas inteiras. O que houve com esses livros? Em algum momento, a escola os recebeu. Mas sumiu com eles. Talvez os tenha vendido para reciclagem, a fim de pagar os caros e insultuosos volumes que agora completam a sua biblioteca. O aluno não tem acesso aos volumes de literatura brasileira e estrangeira, que às vezes até ficam escondidos atrás de coisas guardadas ao acaso. Mas o acervo de blockboosters da espúria indústria livreira é visto como uma conquista. Mesmo que todas as diretrizes curriculares, feitas de 1990 para cá, condenem a leitura de tais obras, e façam do objetivo da leitura de obras literárias o reconhecimento de que esses volumes não possuem valor literário. Querem formar o gosto junto com o juízo.

Triste ver que tais alunos não podem ter acesso à literatura de qualidade, nem mesmo à literatura infantil que seja relevante. Triste pensar no modo como uma autora como Lajolo descreve os procedimentos para que a literatura infantil seja lida e apreciada nas escolas, diante de uma escola que produz os resultados opostos àqueles dispostos como objetivos nos currículos oficiais. Quando os comparo com os alunos, em escolas de interior, que liam obras literárias reais, efetivas, com imenso prazer, é algo que faz lembrar as escolas da década de 70. Seria preciso criar uma Comissão da Verdade para escolas assim. Mas os alunos que liam obras literárias no interior tiravam notas até 3,0 pontos acima da média nacional em exames como Prova Brasil e ENEM. E eram notas que correspondiam ao que as diretrizes curriculares queriam para eles.

A falsificação da natureza da literatura ofende a quem conhece a arte literária. A Arte está acima da educação, como é evidente pela leitura de O fictício e o imaginário, de Iser. É a Arte que explica o real, mesmo nas sociedades sem ciência nem religião. A escola brasileira falsifica aquilo que deveria explicar, apenas para não ter o trabalho de fazê-lo. A literatura continua a mais relevante das artes, não precisa da escola, surgiu antes dela e sobreviverá a ela. Já o aluno...


Vejo isso acontecer há quase vinte anos. Só agora vira notícia

17/05/2012-15h35

Professora é acusada de punir alunas que não emendaram feriado em SP

 
FELIPE LUCHETE
DE SÃO PAULO

Uma professora de português de Taubaté (140 km de SP) mandou duas alunas do 9º ano fazerem exercícios físicos por terem ido à escola no dia em que os colegas combinaram de faltar, na semana do feriado de 1º de Maio, segundo as estudantes.
De acordo com os pais de uma das adolescentes, de 14 anos, a professora disse para elas descerem ao pátio para fazer abdominais, flexões e polichinelos no dia 3 de maio.
A professora também chamou as meninas de "trouxas", disse o pai de uma das jovens que estudam na escola municipal Ernani Giannico.
Segundo ele, a professora contou sobre o castigo aos outros colegas quatro dias depois, no meio da aula, e disse que daria falta para os estudantes que fossem à aula em dias próximos a feriados.
A mãe da menina disse que procurou a professora e que ela confirmou o ocorrido, mas afirmou ter se tratado de brincadeira.
A reportagem não conseguiu contato com a professora. A Secretaria Municipal de Educação disse que abriu sindicância para apurar o caso e que a docente tirou licença para tratar de problemas de saúde.

domingo, 13 de maio de 2012

Quem diria? Um retrato da classe que usa livros decorativos para mostrar cultura


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Gol de letra
O ex-jogador Tufão, personagem de Murilo Benício na novela 'Avenida Brasil', descobre o prazer da leitura com Kafka, Flaubert e Freud
Divulgação
Murilo Benício como Tufão em 'Avenida Brasil'
Murilo Benício como Tufão em 'Avenida Brasil'

ELISANGELA ROXO
MARCO RODRIGO ALMEIDA
DE SÃO PAULO
A conversa a seguir é coisa de novela. "Tá lendo o quê?" "Um livro que a Nina me emprestou. Madame Bova... de Bovári." "Qual é a dessa madame aí?" "Essa é louca. Sabe que ela trai o marido, mas não gosta do amante? Vai entender!" "Coisa de intelectual."
Quem experimenta ler pela primeira vez o clássico "Madame Bovary", de Gustave Flaubert, é o ex-jogador de futebol Tufão (Murilo Benício), de "Avenida Brasil", no ar às 21h na Globo.
Na cama, antes de dormir, ele conversa sobre suas leituras com a mulher, a vigarista Carminha (Adriana Esteves).
"O sonho é a estrada real que leva ao inconveniente", declamava ele, no capítulo da última terça, ao ler um trecho de "A Interpretação dos Sonhos". Mas só o próprio Freud, ou "Fred", como Tufão diz, pode explicar a licença poética de trocar o "inconsciente" do original por "inconveniente".
A mansão de Tufão tem biblioteca, mas os livros eram apenas decorativos, todos ocos. Os reais chegaram pelas mãos de Nina (Débora Falabella), que busca vingança contra Carminha e, para atingir seu objetivo, trabalha como cozinheira da família.
Os livros são usados por ela para abrir os olhos do ex-jogador sobre o mau-caratismo da mulher, que o trai com o próprio cunhado.
"Ela usa a cultura e a culinária para seduzir as pessoas da casa. É uma inversão de valores. A criada tem mais cultura do que os patrões", explica João Emanuel Carneiro, autor de "Avenida Brasil".
DE OLHOS BEM ABERTOS
A leitura não é um hábito comumente retratado em novelas. Neste caso, porém, além de Flaubert e Freud, Tufão também ficou vidrado no livro "A Metamorfose", de Franz Kafka (leia acima).
É a literatura que desperta o personagem de Benício. "Tufão vai ficar mais sensível. Nina mostrou um novo mundo a ele, o que vai fazê-lo se apaixonar por ela. Mais do que isso eu não falo nem bêbado", brinca Carneiro.
O autor criou relações entre as tramas dos livros e da novela, um artifício divertido que chamou a atenção dos pesquisadores.
"Estamos diante de uma metalinguagem, uma narrativa telenovelesca com referência a uma literária", diz Mauro Alencar, doutor em teledramaturgia pela USP.
Para Nilson Xavier, autor de "Almanaque da Telenovela Brasileira", a narrativa traz uma mensagem quase subliminar. "Espero que Nina dê o romance 'O Conde de Monte Cristo', de Alexandre Dumas, a Tufão, para lhe revelar sua vingança", torce.
O autor adianta, porém, que o próximo exemplar da estante de Tufão será o clássico da literatura nacional "Memórias Póstumas de Brás Cubas", de Machado de Assis.
Especialistas em literatura acreditam que as citações em "Avenida Brasil" podem atrair a atenção do público para obras canônicas.
"Não importa o meio, o importante é estimular o contato com essas obras. Quem sabe não pode estimular o nascimento de leitores ou até de escritores?", pergunta Leyla Perrone-Moisés, professora de literatura francesa na USP.
Essa, porém, não é a intenção primordial de Carneiro. "Acho excelente que novela tenha um papel social, mas não sou engajado. O uso da literatura é uma questão da trama, e não um merchandising social", explica.
Tércio Redondo, professor de literatura alemã da USP, diz que livros não são manuais de respostas simples e diretas. "A literatura abre os nossos olhos para o que a indústria cultural ignora." Ao que tudo indica, eles já estão abrindo também os de Tufão.
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sábado, 12 de maio de 2012

O governo tem feito a parte dele; as escolas, não


Parece um contrassenso escrever em um artigo para uma revista dizendo que o Paraná foi um estado pioneiro na elaboração de uma proposta curricular condizente com os ideais de uma educação fundamentada cientificamente. Isto foi o Currículo Básico para a Escola Pública do Estado do Paraná.  Na época, começo dos anos 90, surgiram os planos docentes baseados em uma concepção oficial de disciplina. Quando o governo federal elaborou o que é o currículo nacional brasileiro, no qual as avaliações institucionais se baseiam, já era uma rotina no Paraná a adoção de um currículo que tentava impedir as escolas e os professores de ensinarem as suas crenças pessoais em vez do conhecimento científico organizado.

Lembro que em 2010, em um congresso na Unisinos, eu conversava com Anna Rachel Machado, da PUC-SP, sobre o fato de que os documentos oficiais do estado do Paraná, mandados para as capacitações docentes, proibiam o uso do currículo nacional. A professora Anna Rachel riu muito disso, e chamou a professora Inês Signorini, da Unicamp, que autografava um livro, para contar isso a ela. Esta debochou da atitude do governo daqui. Nós estávamos em um coquetel na livraria da universidade. E a nossa conversa foi interrompida pela chegada da governadora, que causou um grande desconforto, graças ao esquema de segurança que ela conduzia. Ela estava em dias de manifestações populares pela sua cassação. Veio conversar com as professoras. Por isso, a professora Anna Rachel combinou de a gente conversar sobre isso no dia seguinte, após as conferências. Disse que esse assunto lhe renderia um artigo. O que chocava a professora, que naquele evento fora chamada por Bronckart de “a maior autoridade no ensino de línguas no Brasil”, era o descumprimento de uma lei federal, como um currículo nacional em vigor. Essas coisas só aconteciam no Brasil, como ela disse.

Existem as concessões políticas, que geram enganos. Mesmo assim, não é possível não ver no esforço dos governos, seja o estadual ou o federal, um motivo para um reconhecimento do valor de sua atitude. Essa preocupação com a educação, mostrada já no primeiro governo Requião, na década de 90, era uma atitude no sentido de disciplinar escolas e professores, coibir os achismos, a conversa fiada dos professores formados pela ditadura. Já o esforço do governo Fernando Henrique Cardoso em dar essa mesma perspectiva científica ao país todo era algo essencial naquele momento. Tal como universalizar o acesso à escola, era necessário dizer que não se tratava de uma brincadeira, mas que tudo era feito com sérios objetivos. Por isso, algumas das melhores cabeças do país escreveram uma proposta curricular científica e moderna. Os Parâmetros Curriculares Nacionais estão em vigor, com o valor de decreto-lei. O defeito estava no fato de colocar na mesma cesta um estado como São Paulo e outros como Maranhão e Piauí.

A atitude do governo Lerner foi de capacitar os docentes, principalmente aqueles formados segundo as ideologias da ditadura e sem visão científica, pois as universidades haviam melhorado muito a formação de docentes após a redemocratização. Os novos professores já sabiam o que iriam encontrar nos programas de capacitação. Aqueles antigos achavam tudo desnecessário, e faziam suas avaliações apenas para concluir os cursos, reclamando. Mas era sobretudo a cobrança para que todo plano docente seguisse os parâmetros nacionais que demonstrava a seriedade dos objetivos daquele governo. O ensino tinha objetivos universais, e a aprovação era a consequência.

Quando o governo Requião começou a elaborar uma proposta curricular paranaense, ele ouviu os professores. Alguns escolhidos. Mas a tônica dos encontros acabava sendo sempre as condições de trabalho do docente, porque os professores não se interessavam pela discussão de concepções e metodologias: queriam apenas falar sobre médias, aprovação em conselhos de classe, a falta de hora-atividade. Foi uma alegria imensa ver a proposta paranaense elaborada, madura, científica, sem que o blá-blá-blá docente respingasse nas concepções de disciplina adotadas pelo currículo. A voz do professor aparece no abandono de uma concepção moderna de avaliação, a que está na proposta nacional, por algo que permite ao professor o achismo e o improviso, e traz de volta um modelo quantitativo, enquanto o resto do país caminha no sentido de abandonar o modelo da ditadura. O Paraná regrediu em seu modelo de avaliação. Viu no aluno um depósito de informações, das quais o professor é portador. Agradou os sindicalistas, ao colocar o professor acima de Vygotski e Piaget.

Mas a proposta curricular paranaense era moderna, científica, avançava em relação à proposta nacional, no que se refere a conteúdo e metodologia. O esforço do governo Requião para que sua proposta fosse seguida foi algo digno de quem se interessa por educação. O governo estava fazendo a parte dele. As propostas eram feitas a partir das Diretrizes Curriculares Estaduais, mas o professor não as efetivava na sua prática. Continuava, muitas vezes, na época da ditadura. E as pedagogas faziam vistas grossas, esquecendo que uma de suas funções é fazer com que a ação docente corresponda à proposta estadual. Mesmo assim, havia os cursos de capacitação, e uma esperança de que um dia o professor agisse de modo científico. Mesmo à custa de ofertas em dinheiro, como tantos programas de capacitação acabam sendo.

De fato, os governos quiseram melhorar a educação. Não há que se culparem, pelo menos os governos estaduais, pelos índices de desempenho dos alunos. As escolas receberam equipamentos, mesmo os estudos científicos mostrando que o impacto disso tudo sobre os resultados dos alunos é algo irrisório. Deve ser sintomático que uma escola de Tamarana, humilde e interiorana, seja a melhor escola pública do estado. Nada de acrílicos, computadores sobrando, quadras imensas. Apenas a noção de que existe uma proposta curricular séria (ou mais de uma, pois a lei não permite contradição entre o currículo federal e o estadual), que deve ser seguida. E de que os achismos de professores devem ficar restritos aos seus cadernos dos tempos de ditadura.

E, no entanto, ainda querem responsabilizar os governos pelos índices de fracasso da educação brasileira. Lembro que, em 2009, mandei flores e um cartão para a secretária de educação do município em que lecionava, ao perceber que os alunos chegaram à quinta série com as habilidades esperadas para a série. Não era mais preciso dizer aos alunos de onze anos que o S intervocálico tem som de Z, ou que a conversa deles na hora do lanche é um texto.

Nada disto chegou à capital do estado, que continua tecnicista, anticientífica, feita de achismos e de pirotecnia propagandista. A proposta curricular seguida na capital ainda é a lei 5692, da era Médici.


Aluno agride professor depois de ser repreendido em Bauru, SP


20/03/2012 10h20- Atualizado em 20/03/2012 20h30

Aluno agride professor depois de ser repreendido em Bauru, SP

O adolescente deu socos e chutes na vítima.
Quatro alunos também foram parar na delegacia por ameaçar colegas.

Do G1 Bauru e Marília
Duas ocorrências envolvendo alunos em escolas estaduais foram registradas nesta segunda-feira (19) na região Sudeste de Bauru, no interior de São Paulo.

Na primeira, na Escola Franciso Alves Brisola, um aluno de dezessete anos agrediu um professor após ser repreendido por estar fora da sala de aula. O adolescente deu socos e chutes na vítima.

O jovem precisou ser contido por outras duas professoras que estavam no local. Ainda durante a confusão, ele chutou uma porta e quebrou uma cadeira.

Arma de brinquedoMais tarde, na Escola Estadual Luis Zuiani, quatro alunos entre 13 e 14 anos foram parar na delegacia após serem surpreendidos por duas inspetoras ameaçando colegas com uma pistola de brinquedo. Os estudantes foram ouvidos e liberados no DP, na presença dos pais, e o simulacro de arma foi apreendido.
Em nota, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo afirmou que lamenta a agressão cometida por um aluno contra o coordenador da Escola Estadual Francisco Alves Brizola. Diante do ocorrido, a secretaria informou ainda que o aluno ficará suspenso por três dias.
Em relação ao casa do Escola Estadual Doutor Luiz Zuiani, a Secretaria esclareceu que, diante do ocorrido, a polícia foi acionada e registrado Boletim de Ocorrência. Na segunda-feira, a direção convocou os pais dos alunos envolvidos para uma reunião, na qual foram discutidas medidas socioeducativas a fim de evitar a reincidência do caso..

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Por que o Brasil é o 85º colocado se, nas avaliações de leitura e matemática, fica sempre entre os 3 piores? Quantos países não participam desse ranking?

terça-feira, 8 de maio de 2012

Professauros: suas avaliações


           Celso Antunes, em um inocente livro sobre o que ele chama de "professauro". Sim, o professor formado nas épocas de ditadura e de obscurecimento do conhecimento científico. O professor de prova e trabalho, que usa a dinâmica apontada por Antunes no quadro acima. E que confunde anos de trabalho com experiência, mesmo ele tendo servido aos interesses da ditadura e ajudado a formar a população iletrada de hoje. Hoje, o professauro precisa preservar os seus parques, mesmo desobedecendo às diretrizes nacionais de educação formulada pelos governos democráticos.


Imagem postada por colega.

Escolas curitibanas: a deformação das leis sobre avaliação


Como é possível exigir das pessoas que elaboram regimentos e propostas curriculares nas escolas um mínimo de conhecimento conceitual, se elas se dão o luxo de desconhecerem as normas mais primárias da variante em que os escrevem?
Os trechos abaixo são exemplos crassos:
                                 (...) foi autorizado a construção (...).
É um momento em que o professor deve usar exclusivamente para práticas relacionadas as suas atividades profissionais: correção de provas, planejamento, elaboração de provas, atendimento de alunos e pais, entre outros. 
A cada caso que fuja da alçada do professor resolver em sala de aula, deverá ser encaminhado, por escrito, à Equipe Pedagógica.

Fruto de uma construção coletiva onde participaram direção, professores, funcionários (...). 

Não há como negar que, temos alunos que chegam à escola sem a noção de limites e de alguns valores fundamentais (...).

Os atores envolvidos realmente demonstraram interesse, garra e motivação para construir o nosso PPP. Quiseram, desde o início, constituir um documento nosso, uma fonte de pesquisa e um norte para todas as nossas ações.

Como subsídio, além do referencial bibliográfico, também serviram de apoio as versões dos PPP’s anteriores.

Veiga (2001) traz importantes contribuições sobre está temática (...).

                               Libâneo (2001, p. 125) aborda está temática ao destacar (...). 

(...) é importante termos presente quais ideais movem as pessoas (...). 

Espera-se ações docentes que visem o desenvolvimento intelectual (...). 

É evidente a falta de habilidades de domínio da variante padrão nas pessoas que escreveram os trechos acima. Mais que isso, é possível perceber a pressa e o desarranjo que orientam a digitação dos mesmos. O que se percebe aí é o aluno tradicional de escola pública resmungando por ter que entregar uma pesquisa copiada de algum documento, e que faz aquilo com pressa e desinteresse. Apenas para receber nota, o aluno; apenas para que uma repartição qualquer afixe um carimbo, a escola.
Esse antigo aluno quase sem habilidades cita teóricos, fala de leis, mas seria ingenuidade supor que ele compreenda o teor de tais textos, se nem sequer percebe a relação dos predicativos com os sujeitos a que se referem (“foi autorizado a construção”), no uso mais banal da língua portuguesa. Nada de regência básica, mas deve ter feito provas sobre isso. Esse antigo aluno ainda mantém em si os resquícios de uma variante inadequada ao contexto (“demonstraram interesse, garra e motivação”). Nem passa pela cabeça do pedagogo que no trecho existe uma gíria, e que ele está elaborando um documento oficial. Esse mesmo antigo aluno de magistério, que certamente já deu aulas para as séries iniciais, não percebe a relação entre o uso de acento e a sílaba tônica da palavra (“aborda está temática”). No entanto, esse mesmo pedagogo acredita que corrigir problemas de português é saber regras de ortografia.
Essa incompreensão de princípios de escrita também se evidencia na incompreensão de princípios legais ou conceituais. Não interessa a essas pessoas se os autores que elas citam na bibliografia de seus textos têm um conceito de avaliação que está em desacordo com o que elas escrevem, elas os usam apenas para conseguir a aprovação da autoridade. Logo em seguida, negam os conceitos que defendem. Veja-se o que o Projeto Político-pedagógico de um colégio de região nobre de Curitiba afirma sobre avaliação:
Quanto à avaliação da aprendizagem, entendemos que temos que buscar uma prática avaliativa que não tenha um fim em si mesma, que não estabeleça como objetivo principal a classificação, a atribuição de nota ao aluno, mas que seja um ponto de partida para a intervenção e reformulação do processo de ensino. Conforme o disposto na Deliberação do CEE nº 07/99 e em nosso Regimento Escolar, os professores utilizam instrumentos diversificados, buscando valorizar a reflexão, a crítica, o estabelecimento de relações entre os conteúdos trabalhados e não somente a memorização e repetição da matéria estudada.
A ideia de uma avaliação como meio é evidente entre quem escreve sobre educação. Percebe-se a colagem do que determina a Deliberação 07/99, que nada mais é que uma aplicação do que determina a LDBEN sobre o assunto. A diversidade de modos de avaliação, embora o termo “instrumento” já signifique que a avaliação é algo passável, está afixada nas leis, só que de um modo científico. Lá, essa ideia não tem a ingenuidade dos docentes e dos pedagogos que a reduzem ao chavão prova, trabalho, atividade. No texto da lei, avaliação se refere a modos científicos de se chegar a uma aprendizagem significativa, e não apenas a uma nota. Trata-se de projetos, produções dentro de gêneros definidos (não só na disciplina língua portuguesa). Produzir conhecimento significativo.
O trecho citado acima é de uma das poucas propostas curriculares, dentre as consultadas, que fazem referência às diretrizes curriculares oficiais do estado e do país. Apenas para efeito cosmético. Quando se atenta para o documento que orienta o sistema de avaliação de um modo não mais científico e conceitual, mas unicamente regulamentar, o que se percebe é a negação peremptória do que o documento escolar apregoa no trecho citado acima. Não apenas sem referência no universo científico, mas inclusive proibido pela mesma deliberação citada no documento:
Art.63 – Para a verificação da aprendizagem, cada componente curricular deverá utilizar, em cada bimestre, instrumentos diversificados onde:
I - as avaliações formais (provas e testes escritos) totalizem a nota 7,0 (sete vírgula zero) distribuída em no mínimo dois instrumentos no bimestre;
            II - as demais produções do aluno realizadas com a orientação do professor como: pesquisas e trabalhos escritos, apresentações individuais e/ou em grupo, produção de textos, relatórios e outras atividades previstas no Plano de Trabalho Docente que tenham por objetivo a sistematização da aprendizagem do aluno, diagnosticando o seu nível de apropriação do conhecimento, totalizem a nota 3,0(três vírgula zero).
O artigo 24 da LDBEN é um dos documentos básicos que norteiam, com o peso de lei federal, as possibilidades de um sistema de avaliação:  “avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais.” A deliberação estadual sobre sistemas de avaliação tem o objetivo de divulgar, para o professor paranaense, aquilo que a lei federal determina. Essa mesma deliberação foi assunto dos programas de capacitação docente há cerca de dez anos, e a escolas reformularam suas propostas para estarem adequadas. No entanto, a proposta do colégio citada acima desconsidera a lei. De um modo acintoso e exacerbado, pela certeza de que nenhuma autoridade a corrigirá. A LDBEN deixa claro que o esforço da educação nacional deve se dirigir para a superação do modelo quantitativo, algo também claro nas propostas paranaenses, que aceitam a proposta nacional, “vista como mais adequada ao dia-a-dia da sala de aula e como grande avanço em relação à avaliação tradicional, que se restringe tão somente ao somativo ou classificatório.” A superação do quantitativo é algo escarnecido pela proposta deste colégio. Na proposta de um outro colégio também tradicional, ela se resume a uma incompreensão de sentido, típica da falta de habilidades de leitura: “O sistema de avaliação é simples e objetivo, válido para todas as disciplinas. A avaliação de cada bimestre terá valor 5,0. As atividades valem 2,0 pontos e o trabalho valerá 3,0 pontos.” Tal proposta poderia representar somente um problema de incompreensão do sentido do que o artigo 24 dispõe, mas ela vai além. Ou seja, o fato de que a LDBEN proíba a existência de provas e testes que valham a maioria da nota não significa que elas possam valer a metade da mesma. O texto da lei fala em “prevalência”, e não em igualdade de valores. Que uma prova bimestral valha 5,0 pontos é uma estratégia para que o professor acomodado reduza seu sistema de avaliação ao mínimo de registros possível. Mais do que apenas reduzir, a proposta a encaixa em três menções. Mais do que isso, faz dessas menções apenas a confirmação inapelável de que os autores dessas propostas não conhecem os autores citados nas suas bibliografias, nem as leis nacionais. Parece motivo de riso que uma proposta chame de “avaliação formal” aquilo que pedagogos como Celso Vasconcellos e Júlio Furtado nem sequer chamam de avaliação, e que boa parte deles chama de “avaliação entre aspas”, que faz pensar exatamente no pensamento reducionista e sem base conceitual que levou o autor da proposta a usar tal expressão para se referir à prova. Reducionista, manipuladora, contra a lei federal. Sem base científica, feita para a década de 70, para a escola tradicional e tecnicista da ditadura militar. A opinião sem fundamento dos generais hoje é a opinião reducionista das pedagogas que nem aprenderam a escrever. E passa a ser a visão unilateral do aluno, como o de outra escola, vizinha das demais aqui citadas, na qual o aluno só reconhece como meios de avaliação aqueles que seu regimento determina. Nele, as atividades que a LDBEN recomenda como “prevalência” apenas existem como uma mistificação chamada de “atividade diferenciada”, que o aluno não vê como avaliação nem como trabalho. Aqui, a influência de uma comunidade escolar mal informada gera as aberrações sem valor conceitual.
Chama a atenção o uso infantiloide da palavra “trabalho” nessas propostas. Faz pensar no aluno de ensino básico, que passou a chamar por esse nome não a sua ação como aluno, diária, mas apenas alguma coisa a ser feita fora do espaço escolar, normalmente cópia de alguma coisa, e que não representa nenhum texto definido: não é resumo, nem relatório, nem resenha, mas essa cópia garante ao aluno os pontos residuais que lhe farão chegar à nota, caso fracasse nas risíveis “avaliações formais”, expressão que indica a falta de critérios ou de uma “forma” na execução das demais tarefas. Grosso modo, querem dizer: “não interessa quem fez, desde que o professor tenha isso em mãos para dar nota.” Não são atividades processuais, desenvolvidas na rotina escolar, tal como a lei apregoa.

Esse abandono das leis que orientam a avaliação, nas escolas curitibanas, é uma atitude endossada pelas autoridades. Esse endosso garante que uma proposta absurda, como a de se fazerem provas valendo 7,0 pontos, seja aceita e praticada por um corpo docente composto por dezenas de professores. Deve ser por isto que soa tão ridículo quando essas propostas apregoam ser o resultado de um trabalho coletivo. Imoral, ilegal, escrita como se cada aluno de ensino fundamental tivesse se sentado na cadeira da pedagoga, cada uma dessas propostas é o resultado da visão distorcida que cada docente carrega consigo, e que representa apenas um modo facilitador de se poupar o trabalho de uma avaliação verdadeira, como está na lei e nos teóricos. Cada um deles a escreveria com esse mesmo português de adolescente apressado dos trechos acima, e que, na hora de dizer o que acha que deve ser mudado na escola, pede um lanche mais barato. Querem a década de 70 (ou de 7,0) de volta, e não morrem se antes não o conseguirem.