Quem der uma olhadinha no site "Todos pela Educação" vai lembrar que existem cinco metas para a escola cumprir, no Brasil, até 2022. Nada de extraordinário. Na verdade, coisas tão óbvias como o aluno dominar o conteúdo da série em que estuda. No Brasil, apenas 25% dos alunos têm as habilidades exigidas para a série que cursam. Quem lê essas coisas pensa que o filho estudante integra esse grupo, ou que seu aluno está inserido nesse percentual. Quem leciona disciplinas práticas, como português e matemática, sabe que talvez nem se chegue a esses 25%.
A revista "Veja" publicou, há algumas edições, uma reportagem sobre as escolas de Minas Gerais que estão conseguindo cumprir essas cinco metas. No Paraná, dos quase quatrocentos municípios, apenas dez estão cumprindo. Cidades poderosas, abastadas? Gente de origem europeia, acostumada a ler? Nada disso. Dez cidades pequenas, algumas até com menos de dez mil habitantes. Algumas, com um pouco mais. Algumas localizadas em regiões de difícil acesso, através de rodovias sucateadas. Mas, elas estão cumprindo as cinco metas. Apenas cinco. Gente que não tem livros em casa. Metas como a de fazer o aluno que está há três anos na escola saber ler e escrever. Como é de praxe, os alunos têm um desempenho razoável nos primeiros anos do ensino fundamental. Depois, quando entram para a escola estadual, o nível cai. Dez, quinze pontos nas avaliações.
O pior é que, quem já conviveu com aluno saído de uma dessas escolas que estão dentro do esperado, sabe que o nível é fraco. Já tive alunos vindos de uma dessas escolas. Era inaceitável ver que o aluno estava muito abaixo do esperado, exigindo acompanhamentos mais cuidadosos. Não eram plenamente alfabetizados na sétima série. Fica difícil acreditar que essas escolas constroem qualidade. Tantas vezes, elas erradicam a evasão e a repetência, e conseguem números altos nas avaliações. Mas, quanto às habilidades, é duvidoso. A Prova Brasil, por exemplo, preocupa-se com quatro habilidades, não avalia a escrita. É ligeira e superficial.
Amanhã começa o SIELP, na Universidade Federal de Uberlândia. Inscrevi um trabalho em que comparo a falta de habilidades de alunos de escolas de regiões pobres de Curitiba com a mesma falta de habilidades de alunos de regiões ricas. Não há que se culpar a pobreza, as crises familiares, a qualidade de vida. Na maioria dos casos que analisei, o aluno de regiões pobres tem mais habilidades que o das escolas consideradas modelos. Tudo é apenas uma questão de currículo: quanto mais científico e próximo das propostas curriculares oficiais o currículo adotado, mais o aluno domina conceitos básicos.
No entanto, o esforço da escola pública daqui, deste estado com apenas dez cidades cumprindo metas, é para que tudo que se discuta nesses eventos, com pessoas da Suíça, da França, seja escondido e visto como falta do que fazer. Tal como as propostas curriculares, que as escolas escondem, ou proíbem que o prfessor adote. Para elas, é uma necessidade apoiar-se mais nos chavões construídos há décadas, que no conhecimento científico, empírico. Estatísticas, dados, como os da organização "Todos pela Educação", merecem apenas o descaso e o deboche das escolas. Todos acreditam que já estão em 2022 com as metas cumpridas.
Existe o fracasso da educação pública, e existem causas.
O fracasso da educação pública é algo assimilado pela opinião pública brasileira. É como falar sobre a corrupção na política. Admite-se, mas não se enxergam causas nem soluções. É mais um mal da sociedade brasileira que, grosso modo, nem adiantaria trazer para a discussão. Poderia ser mais um tema para humorísticos e discursos de palanque, mas o brasileiro não quer se envolver no problema. Rende reportagens na televisão, denúncias na imprensa, mas não é algo que tire o sono daquele que frequenta uma escola ou manda seu filho passar horas diárias em uma delas. Nada além de mais uma fraqueza do país.
Existe uma vasta bibliografia sobre o fracasso da escola pública. Mas que é feita para educadores preocupados com currículos e metodologias. Na verdade, é um diálogo que se efetiva apenas no meio acadêmico. E que acaba influenciando decisões políticas. Estatísticas, avaliações institucionais. No entanto, quem trabalha ou trabalhou na escola pública e, além disso, estudou nela, sabe que as causas de seu fracasso se evidenciam nas ações cotidianas ali praticadas. Há inúmeros culpados. Diretores, professores, alunos, pais, pedagogos, burocratas.
Existe uma máscara encobrindo as causas desse fracasso. E que encobre soluções que ultrapassem os âmbitos curricular e metodológico, com todos os recursos físicos que estes envolvem. A máscara cria falsos mitos para encobrir os verdadeiros culpados. Ela erige falsos mártires. Transforma em vítimas aqueles que são imediatamente culpados pelas ações que levam ao fracasso. E que insistem nessas ações.
Não há dúvida: as causas são muitas. Vão desde a aula mal dada à aula nunca dada. Entre uma e outra, a máscara é construída por todos que estão envolvidos no processo educacional. E atrás dela existe um mundo inacreditável, que a imprensa não denuncia, que o acadêmico não coloca em suas pesquisas, que a autoridade finge não perceber, e que existe porque inúmeras pessoas ganham com esse fracasso. E são ganhos de inúmeros tipos.
Por que não falar sobre isso? Mas falar do ponto de vista de alguém que presenciou cada uma das causas desse fracasso aqui apontadas. Desde a vida como aluno até o trabalho como professor e pesquisador. Alguém que estranhou a probição que recai sobre essa discussão. E que passou a ver a própria discussão oficial sobre o assunto como uma máscara. Dizer que a escola ganhou um computador ou que não o possui é só uma forma de não se dizer que o instrumento vai ser usado para burlar o processo pedagógico. Mas, quem o disser estará fora da dança de quadrilha que é o debate sobre educação, não formará um trenzinho nem girará no círculo daqueles que se envolvem no assunto.
É preciso ter a coragem de dizer: na educação pública acontece isso, acontece aquilo, e tudo isso gera o inevitável: o fracasso. Que nenhum dos programas oficiais voltados para a melhoria do ensino público vai conseguir vencer. Tal como a escola pública acontece hoje, ela só poderá acabar em falência completa.
Existe uma vasta bibliografia sobre o fracasso da escola pública. Mas que é feita para educadores preocupados com currículos e metodologias. Na verdade, é um diálogo que se efetiva apenas no meio acadêmico. E que acaba influenciando decisões políticas. Estatísticas, avaliações institucionais. No entanto, quem trabalha ou trabalhou na escola pública e, além disso, estudou nela, sabe que as causas de seu fracasso se evidenciam nas ações cotidianas ali praticadas. Há inúmeros culpados. Diretores, professores, alunos, pais, pedagogos, burocratas.
Existe uma máscara encobrindo as causas desse fracasso. E que encobre soluções que ultrapassem os âmbitos curricular e metodológico, com todos os recursos físicos que estes envolvem. A máscara cria falsos mitos para encobrir os verdadeiros culpados. Ela erige falsos mártires. Transforma em vítimas aqueles que são imediatamente culpados pelas ações que levam ao fracasso. E que insistem nessas ações.
Não há dúvida: as causas são muitas. Vão desde a aula mal dada à aula nunca dada. Entre uma e outra, a máscara é construída por todos que estão envolvidos no processo educacional. E atrás dela existe um mundo inacreditável, que a imprensa não denuncia, que o acadêmico não coloca em suas pesquisas, que a autoridade finge não perceber, e que existe porque inúmeras pessoas ganham com esse fracasso. E são ganhos de inúmeros tipos.
Por que não falar sobre isso? Mas falar do ponto de vista de alguém que presenciou cada uma das causas desse fracasso aqui apontadas. Desde a vida como aluno até o trabalho como professor e pesquisador. Alguém que estranhou a probição que recai sobre essa discussão. E que passou a ver a própria discussão oficial sobre o assunto como uma máscara. Dizer que a escola ganhou um computador ou que não o possui é só uma forma de não se dizer que o instrumento vai ser usado para burlar o processo pedagógico. Mas, quem o disser estará fora da dança de quadrilha que é o debate sobre educação, não formará um trenzinho nem girará no círculo daqueles que se envolvem no assunto.
É preciso ter a coragem de dizer: na educação pública acontece isso, acontece aquilo, e tudo isso gera o inevitável: o fracasso. Que nenhum dos programas oficiais voltados para a melhoria do ensino público vai conseguir vencer. Tal como a escola pública acontece hoje, ela só poderá acabar em falência completa.
terça-feira, 29 de maio de 2012
quinta-feira, 17 de maio de 2012
A falsificação das propostas curriculares de literatura: um exemplo curitibano
Há uma semana, discutiam-se em Porto Alegre os rumos do
ensino de literatura infantil nas escolas. Um congresso reunindo pessoas de
vários países. Deve parecer estranho a pessoas de países como Argentina e
Portugal que não exista, no Brasil, um ensino de literatura organizado. Elas não
sabem que existem propostas sérias neste sentido.
No começo deste mês, conversando com um antigo aluno, que
mudou para Portugal, foi uma grata surpresa ver que ele sabe exatamente em que
canto de Os lusíadas existe uma
referência à cidade em que mora. Da mesma forma, outro ex-aluno, que migrou
para a França no começo de 2011, mesmo estudando em uma sala especial para
imigrantes, conhece nomes de autores
franceses e suas obras. É um aluno de sexta série.
No Brasil, existe a prática de não se trabalhar com a
literatura, mas apenas com fatos da história literária, resumidos em datas e
nomes. Pior que isso, os autores de que se fala são colocados na condição de
relevantes pela qualidade, e um livro notoriamente ruim, como A escrava Isaura, é focalizado como se
se tratasse de obra meritória. O professor não pede a leitura de livros assim
com a intenção de focalizar o fenômeno literário, mas apenas como uma obrigação
curricular. E o aluno sai da aula sem entender por que existe literatura no
currículo.
A literatura infantil segue passos semelhantes. Ela é vista
apenas como fruição, entretenimento que a criança pode trocar por um desenho
animado e ganhar em velocidade e quantidade de informação. A professora
primária, que não faz a menor ideia do que seja o fenômeno estético, incentiva
a leitura como um meio para se chegar a um fim pragmático: melhorar a
ortografia e, novamente, o incremento do senso crítico, que ela mesma não
possui.
As grandes autoridades no ensino de literatura infantil
lamentam que a escola ainda disponibilize obras como as da Série Vaga-lume, e
que autores como Marcos Rey e Maria José Dupré sejam vistos como leituras
recomendadas. Marisa Lajolo ainda fala com preocupação do atrelamento da
literatura a interesses de natureza moralizante. Um livro passa a ser visto
como bom porque focaliza assuntos relacionados ao universo escolar, como
cidadania, negritude, ou aos eternos mitos de uma cultura empolada. Regina
Zilbermann insiste no fato de a escola desatrelar a leitura da formação de
leitores proficientes, e lamenta que a escola recorra a fichas de resumos, a
quantidades de livros e a avaliações. A cultura brasileira do toma-lá-da-cá,
que se converte em sistema de avaliação, conforme afirmam as Diretrizes Curriculares Estaduais de Língua
Portuguesa, acaba fazendo da leitura mais uma obrigação que o aluno troca
por nota, sem nunca chegar a compreender de que se trata.
E, no entanto, as propostas curriculares em vigor procuram o
contrário dessas práticas. Os Parâmetros
Curriculares Nacionais, escritos por pessoas que certamente leram Dante,
Cervantes, Joyce e Faulkner, entre outros, afirmam que a finalidade do ensino
de literatura é a formação estética. Formação que rompa com os modelos criados
pela indústria dos livros. Ou seja, essa proposta retoma preocupações da Escola
de Frankfurt, de filósofos como Adorno e Benjamin, que viam na produção de uma
arte industrial uma das grandes ameaças à formação integral da pessoa. Como
“produto espúrio do capitalismo”, para usar a expressão de um conhecido crítico,
existe o best-seller, que não
corresponde a nenhuma literatura, mas apenas aos produtos de uma indústria
cultural. A preocupação dos Parâmetros
Curriculares Nacionais é formar pessoas que conheçam a Arte, e que saibam
diferenciar a obra de arte de valor das produções dessa indústria. A literatura
passa a ver vista em sua condição de Arte, não mais de história a ser decorada.
E o aluno deve ler obras de valor, para poder saber que os produtos dessa
indústria não podem ser vistos como elaborados por artistas. São produtos sem
valor estético.
As Diretrizes
Curriculares Estaduais do Paraná também fazem dessa formação de leitores
proficientes sua intenção norteadora. A literatura não é para ser vista como um
conjunto de fatos, nem deve ser cobrada como uma obrigação a ser cumprida. Os
autores da proposta sabem que os grandes escritores estão entre os maiores
homens que a humanidade produziu, e suas obras não precisam ser trocadas por
notas. A questão é tornar o aluno capaz de ver a grandeza da arte literária. E
ver, consequentemente, o que é medíocre como tal. Primeiramente, a proposta de
2006 adota a perspectiva rizomática como forma de abordagem dos textos
literários. Uma leitura deve induzir a outra, sem preocupação com uma visão
diacrônica. No entanto, essa perspectiva traz de volta o perigo de se fazer da
literatura um pretexto para se falar de novo sobre temas escolhidos a dedo,
como se a obra literária precisasse tratar de temas ou representar uma visão
politicamente correta. Matava-se a Arte em nome de coisas com as quais ela não
tem que se preocupar. A Arte é transgressora, não é serva de convenções
sociais. E a grande arte costuma causar escândalo e desconforto.
Em 2008, quando as Diretrizes
Curriculares Estaduais assumem as preocupações metodológicas da Estética da
Recepção, e faz de autores como Jauss e Iser os fundamentos de sua concepção de
literatura, houve o passo definitivo para que a escola paranaense pudesse
tratar a literatura como ela merece, sem concessões a ideais políticos ou a
modelos fracassados de avaliação. As obras devem ser abordadas como fenômeno
estético. Este fenômeno possui especificidades, e são elas que o professor de
literatura ensina: o que faz do texto literário uma obra de arte, como
interagir com cada obra, vendo nela algo único. Na definição de Iser, cada obra
é um jogo com regras próprias. A aceitação ou não dessas regras é que
possibilita a interação entre obra e leitor. Só a compreensão dessas
especificidades pode gerar o leitor-modelo, de que fala Umberto Eco. Conhecer
as regras de cada obra para poder jogar, como quer Iser.
Quando o Núcleo de Educação me pedia que desse capacitações
aos professores de Língua Portuguesa e Literatura, em eventos como o
NRE-Itinerante, a preocupação dos organizadores recaía sobre a falta de
conhecimento dos professores acerca da literatura em si. E isso era facilmente
constatável: o professor que dá aulas sobre Machado de Assis nunca leu Sterne;
não sabe que só existe Rosa porque antes existiu Joyce; da mesma forma, diante
de um filme para ser visto em seus efeitos estéticos, como Vidas secas, atenta apenas para o enredo, mas nunca para a fábula.
Usando os termos do formalismo russo, é preciso que
professores e alunos reconheçam que a arte literária visa ao efeito estético,
jogo com regras próprias, e que estas são a fábula. O enredo é simplesmente o
assunto, a narrativa. Esta não é o objetivo da literatura, como os ciprestes
não são o interesse da pintura de Van Gogh, mas o pretexto para sua
experimentação estética. O leitor-modelo atenta para a fábula; o leitor que não
sabe do que se trata o fenômeno estético atenta para o enredo e só.
Por isso, o lixo da indústria cultural contém enredo sem
fábula. Nenhuma elaboração estética, apenas as regras que o receptor conhece. O
best-seller é assim; o cinema
comercial; as pinturas compradas na loja de presentes. E é função da escola
formar o aluno para que ele diferencie uma coisa da outra. Seu gosto pode até
ser péssimo; mas seu juízo tem que fazer distinções objetivas.
Choca, é motivo de imensa indignação quando as escolas
insistem em permanecer na década de 70, e fazer da leitura apenas a fruição de
enredos que distraiam o leitor, ou que melhorem suas habilidades ortográficas.
Hoje, isto é incrementado por uma preocupação com a leitura que sirva como
pretexto para discussões ideológicas. O pior é quando tudo é agravado pelo
obscurecimento do que seja literatura, o que traz consigo o ato de esconder as
obras literárias. Em troca, o aluno tem diante de si o lixo da indústria
cultura, o kitsch em sua dimensão
mais espúria, pois necessita de engodos e mistificações para sobreviver. A
leitura de porcarias da produção editorial internacional, sem nenhum valor
estético, é vista como uma conquista por pessoas que nunca em sua vida se
aproximaram da literatura efetiva, ou souberam do que se trata. As escolas
trazem de volta a preocupação com a quantidade de livros, criam fichas de
avaliação, resumos, ou mistificações grosseiras.
Tenho aqui em minha frente dois cadernos de resumos feitos
por alunos da Escola Estadual Ângelo Trevisan, de Curitiba. Esses resumos
correspondem a um modo de a escola checar se o aluno leu o livro. Seguem um
formato que é, na verdade, uma tentativa de mistificar o gênero textual
resenha: dados técnicos, resumo, apreciação crítica. É risível ver alunos, em
pleno século XXI, depois de três propostas curriculares sérias, fazendo resumos
de livros técnicos sobre aves e dinossauros, daqueles que se compram em bancas
de revistas, e considerando-os como obras literárias. Mais que a incompreensão
do aluno, choca a incompreensão do professor, que exige em cada resumo uma
tipologia de personagens, como protagonista e antagonista, como se fossem
categorias literárias. Exclui da literatura o lírico, o ensaístico, a memória.
Autores como Italo Calvino e Borges. O aluno que leu um livro científico, mesmo
infantil, sobre dinossauros, coloca-se na obrigação de dizer quem são o
protagonista e o antagonista do que leu. Mais ainda, o aluno que não dispõe nem
sequer do conceito de literatura é colocado para julgar as obras. Ele não sabe
que o juízo contido em uma resenha é de valor, e não de gosto, um juízo
técnico, que exige preparo. Nunca possuirá esse juízo, pois a referida escola
esconde as obras literárias e disponibiliza aos alunos os produtos da indústria
cultural. Precisará criar essa condição fora da escola. O aluno vive cercado
por bruxos e dragões, mas nunca por obras literárias. O mais estranho é que não
se encontram obras como as que o governo federal incluiu em seus programas de
incentivo à leitura. Entra-se nas bibliotecas escolares em geral, e lá estão
centenas de volumes de inegável valor literário. Os textos que os entendidos
separaram para o aluno ler são obras literárias. O aluno encontra os clássicos,
e também os modernos. Pode ler desde a poesia de Cecília Meireles até a de
Manoel de Barros; desde os contos machadianos à dramaturgia de Ariano Suassuna.
Mas na biblioteca da Escola Ângelo Trevisan há apenas dois ou três volumes do
que é uma coleção com dezenas de títulos, vinte volumes para cada um. E que
preenchem bibliotecas inteiras. O que houve com esses livros? Em algum momento,
a escola os recebeu. Mas sumiu com eles. Talvez os tenha vendido para
reciclagem, a fim de pagar os caros e insultuosos volumes que agora completam a
sua biblioteca. O aluno não tem acesso aos volumes de literatura brasileira e
estrangeira, que às vezes até ficam escondidos atrás de coisas guardadas ao
acaso. Mas o acervo de blockboosters da
espúria indústria livreira é visto como uma conquista. Mesmo que todas as
diretrizes curriculares, feitas de 1990 para cá, condenem a leitura de tais
obras, e façam do objetivo da leitura de obras literárias o reconhecimento de
que esses volumes não possuem valor literário. Querem formar o gosto junto com
o juízo.
Triste ver que tais alunos não podem ter acesso à literatura
de qualidade, nem mesmo à literatura infantil que seja relevante. Triste pensar
no modo como uma autora como Lajolo descreve os procedimentos para que a
literatura infantil seja lida e apreciada nas escolas, diante de uma escola que
produz os resultados opostos àqueles dispostos como objetivos nos currículos
oficiais. Quando os comparo com os alunos, em escolas de interior, que liam
obras literárias reais, efetivas, com imenso prazer, é algo que faz lembrar as
escolas da década de 70. Seria preciso criar uma Comissão da Verdade para
escolas assim. Mas os alunos que liam obras literárias no interior tiravam
notas até 3,0 pontos acima da média nacional em exames como Prova Brasil e ENEM.
E eram notas que correspondiam ao que as diretrizes curriculares queriam para
eles.
A falsificação da natureza da literatura ofende a quem
conhece a arte literária. A Arte está acima da educação, como é evidente pela
leitura de O fictício e o imaginário,
de Iser. É a Arte que explica o real, mesmo nas sociedades sem ciência nem
religião. A escola brasileira falsifica aquilo que deveria explicar, apenas
para não ter o trabalho de fazê-lo. A literatura continua a mais relevante das
artes, não precisa da escola, surgiu antes dela e sobreviverá a ela. Já o
aluno...
Vejo isso acontecer há quase vinte anos. Só agora vira notícia
17/05/2012-15h35
Uma professora de português de Taubaté (140 km de SP) mandou duas alunas do 9º ano fazerem exercícios físicos por terem ido à escola no dia em que os colegas combinaram de faltar, na semana do feriado de 1º de Maio, segundo as estudantes.
De acordo com os pais de uma das adolescentes, de 14 anos, a professora disse para elas descerem ao pátio para fazer abdominais, flexões e polichinelos no dia 3 de maio.
A professora também chamou as meninas de "trouxas", disse o pai de uma das jovens que estudam na escola municipal Ernani Giannico.
Segundo ele, a professora contou sobre o castigo aos outros colegas quatro dias depois, no meio da aula, e disse que daria falta para os estudantes que fossem à aula em dias próximos a feriados.
A mãe da menina disse que procurou a professora e que ela confirmou o ocorrido, mas afirmou ter se tratado de brincadeira.
A reportagem não conseguiu contato com a professora. A Secretaria Municipal de Educação disse que abriu sindicância para apurar o caso e que a docente tirou licença para tratar de problemas de saúde.
Professora é acusada de punir alunas que não emendaram feriado em SP
FELIPE LUCHETE
DE SÃO PAULO
DE SÃO PAULO
Uma professora de português de Taubaté (140 km de SP) mandou duas alunas do 9º ano fazerem exercícios físicos por terem ido à escola no dia em que os colegas combinaram de faltar, na semana do feriado de 1º de Maio, segundo as estudantes.
De acordo com os pais de uma das adolescentes, de 14 anos, a professora disse para elas descerem ao pátio para fazer abdominais, flexões e polichinelos no dia 3 de maio.
A professora também chamou as meninas de "trouxas", disse o pai de uma das jovens que estudam na escola municipal Ernani Giannico.
Segundo ele, a professora contou sobre o castigo aos outros colegas quatro dias depois, no meio da aula, e disse que daria falta para os estudantes que fossem à aula em dias próximos a feriados.
A mãe da menina disse que procurou a professora e que ela confirmou o ocorrido, mas afirmou ter se tratado de brincadeira.
A reportagem não conseguiu contato com a professora. A Secretaria Municipal de Educação disse que abriu sindicância para apurar o caso e que a docente tirou licença para tratar de problemas de saúde.
domingo, 13 de maio de 2012
Quem diria? Um retrato da classe que usa livros decorativos para mostrar cultura
![]() | São Paulo, domingo, 13 de maio de 2012![]() |
![]() |
Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
Gol de letra
O ex-jogador Tufão, personagem de Murilo Benício na novela 'Avenida Brasil', descobre o prazer da leitura com Kafka, Flaubert e Freud
ELISANGELA ROXO MARCO RODRIGO ALMEIDA DE SÃO PAULO A conversa a seguir é coisa de novela. "Tá lendo o quê?" "Um livro que a Nina me emprestou. Madame Bova... de Bovári." "Qual é a dessa madame aí?" "Essa é louca. Sabe que ela trai o marido, mas não gosta do amante? Vai entender!" "Coisa de intelectual." Quem experimenta ler pela primeira vez o clássico "Madame Bovary", de Gustave Flaubert, é o ex-jogador de futebol Tufão (Murilo Benício), de "Avenida Brasil", no ar às 21h na Globo. Na cama, antes de dormir, ele conversa sobre suas leituras com a mulher, a vigarista Carminha (Adriana Esteves). "O sonho é a estrada real que leva ao inconveniente", declamava ele, no capítulo da última terça, ao ler um trecho de "A Interpretação dos Sonhos". Mas só o próprio Freud, ou "Fred", como Tufão diz, pode explicar a licença poética de trocar o "inconsciente" do original por "inconveniente". A mansão de Tufão tem biblioteca, mas os livros eram apenas decorativos, todos ocos. Os reais chegaram pelas mãos de Nina (Débora Falabella), que busca vingança contra Carminha e, para atingir seu objetivo, trabalha como cozinheira da família. Os livros são usados por ela para abrir os olhos do ex-jogador sobre o mau-caratismo da mulher, que o trai com o próprio cunhado. "Ela usa a cultura e a culinária para seduzir as pessoas da casa. É uma inversão de valores. A criada tem mais cultura do que os patrões", explica João Emanuel Carneiro, autor de "Avenida Brasil". DE OLHOS BEM ABERTOS A leitura não é um hábito comumente retratado em novelas. Neste caso, porém, além de Flaubert e Freud, Tufão também ficou vidrado no livro "A Metamorfose", de Franz Kafka (leia acima). É a literatura que desperta o personagem de Benício. "Tufão vai ficar mais sensível. Nina mostrou um novo mundo a ele, o que vai fazê-lo se apaixonar por ela. Mais do que isso eu não falo nem bêbado", brinca Carneiro. O autor criou relações entre as tramas dos livros e da novela, um artifício divertido que chamou a atenção dos pesquisadores. "Estamos diante de uma metalinguagem, uma narrativa telenovelesca com referência a uma literária", diz Mauro Alencar, doutor em teledramaturgia pela USP. Para Nilson Xavier, autor de "Almanaque da Telenovela Brasileira", a narrativa traz uma mensagem quase subliminar. "Espero que Nina dê o romance 'O Conde de Monte Cristo', de Alexandre Dumas, a Tufão, para lhe revelar sua vingança", torce. O autor adianta, porém, que o próximo exemplar da estante de Tufão será o clássico da literatura nacional "Memórias Póstumas de Brás Cubas", de Machado de Assis. Especialistas em literatura acreditam que as citações em "Avenida Brasil" podem atrair a atenção do público para obras canônicas. "Não importa o meio, o importante é estimular o contato com essas obras. Quem sabe não pode estimular o nascimento de leitores ou até de escritores?", pergunta Leyla Perrone-Moisés, professora de literatura francesa na USP. Essa, porém, não é a intenção primordial de Carneiro. "Acho excelente que novela tenha um papel social, mas não sou engajado. O uso da literatura é uma questão da trama, e não um merchandising social", explica. Tércio Redondo, professor de literatura alemã da USP, diz que livros não são manuais de respostas simples e diretas. "A literatura abre os nossos olhos para o que a indústria cultural ignora." Ao que tudo indica, eles já estão abrindo também os de Tufão. Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros |
sábado, 12 de maio de 2012
O governo tem feito a parte dele; as escolas, não
Parece um contrassenso escrever em um artigo para uma
revista dizendo que o Paraná foi um estado pioneiro na elaboração de uma
proposta curricular condizente com os ideais de uma educação fundamentada
cientificamente. Isto foi o Currículo
Básico para a Escola Pública do Estado do Paraná. Na época, começo dos anos 90, surgiram os
planos docentes baseados em uma concepção oficial de disciplina. Quando o
governo federal elaborou o que é o currículo nacional brasileiro, no qual as
avaliações institucionais se baseiam, já era uma rotina no Paraná a adoção de
um currículo que tentava impedir as escolas e os professores de ensinarem as
suas crenças pessoais em vez do conhecimento científico organizado.
Lembro que em 2010, em um congresso na Unisinos, eu conversava
com Anna Rachel Machado, da PUC-SP, sobre o fato de que os documentos oficiais
do estado do Paraná, mandados para as capacitações docentes, proibiam o uso do
currículo nacional. A professora Anna Rachel riu muito disso, e chamou a
professora Inês Signorini, da Unicamp, que autografava um livro, para contar
isso a ela. Esta debochou da atitude do governo daqui. Nós estávamos em um
coquetel na livraria da universidade. E a nossa conversa foi interrompida pela
chegada da governadora, que causou um grande desconforto, graças ao esquema de
segurança que ela conduzia. Ela estava em dias de manifestações populares pela
sua cassação. Veio conversar com as professoras. Por isso, a professora Anna
Rachel combinou de a gente conversar sobre isso no dia seguinte, após as
conferências. Disse que esse assunto lhe renderia um artigo. O que chocava a
professora, que naquele evento fora chamada por Bronckart de “a maior
autoridade no ensino de línguas no Brasil”, era o descumprimento de uma lei
federal, como um currículo nacional em vigor. Essas coisas só aconteciam no
Brasil, como ela disse.
Existem as concessões políticas, que geram enganos. Mesmo
assim, não é possível não ver no esforço dos governos, seja o estadual ou o
federal, um motivo para um reconhecimento do valor de sua atitude. Essa
preocupação com a educação, mostrada já no primeiro governo Requião, na década
de 90, era uma atitude no sentido de disciplinar escolas e professores, coibir
os achismos, a conversa fiada dos professores formados pela ditadura. Já o esforço
do governo Fernando Henrique Cardoso em dar essa mesma perspectiva científica
ao país todo era algo essencial naquele momento. Tal como universalizar o
acesso à escola, era necessário dizer que não se tratava de uma brincadeira,
mas que tudo era feito com sérios objetivos. Por isso, algumas das melhores
cabeças do país escreveram uma proposta curricular científica e moderna. Os Parâmetros Curriculares Nacionais estão
em vigor, com o valor de decreto-lei. O defeito estava no fato de colocar na
mesma cesta um estado como São Paulo e outros como Maranhão e Piauí.
A atitude do governo Lerner foi de capacitar os docentes,
principalmente aqueles formados segundo as ideologias da ditadura e sem visão
científica, pois as universidades haviam melhorado muito a formação de docentes
após a redemocratização. Os novos professores já sabiam o que iriam encontrar
nos programas de capacitação. Aqueles antigos achavam tudo desnecessário, e
faziam suas avaliações apenas para concluir os cursos, reclamando. Mas era sobretudo
a cobrança para que todo plano docente seguisse os parâmetros nacionais que
demonstrava a seriedade dos objetivos daquele governo. O ensino tinha objetivos
universais, e a aprovação era a consequência.
Quando o governo Requião começou a elaborar uma proposta
curricular paranaense, ele ouviu os professores. Alguns escolhidos. Mas a
tônica dos encontros acabava sendo sempre as condições de trabalho do docente,
porque os professores não se interessavam pela discussão de concepções e
metodologias: queriam apenas falar sobre médias, aprovação em conselhos de
classe, a falta de hora-atividade. Foi uma alegria imensa ver a proposta
paranaense elaborada, madura, científica, sem que o blá-blá-blá docente
respingasse nas concepções de disciplina adotadas pelo currículo. A voz do
professor aparece no abandono de uma concepção moderna de avaliação, a que está
na proposta nacional, por algo que permite ao professor o achismo e o
improviso, e traz de volta um modelo quantitativo, enquanto o resto do país
caminha no sentido de abandonar o modelo da ditadura. O Paraná regrediu em seu
modelo de avaliação. Viu no aluno um depósito de informações, das quais o
professor é portador. Agradou os sindicalistas, ao colocar o professor acima de
Vygotski e Piaget.
Mas a proposta curricular paranaense era moderna,
científica, avançava em relação à proposta nacional, no que se refere a
conteúdo e metodologia. O esforço do governo Requião para que sua proposta
fosse seguida foi algo digno de quem se interessa por educação. O governo
estava fazendo a parte dele. As propostas eram feitas a partir das Diretrizes Curriculares Estaduais, mas o
professor não as efetivava na sua prática. Continuava, muitas vezes, na época
da ditadura. E as pedagogas faziam vistas grossas, esquecendo que uma de suas
funções é fazer com que a ação docente corresponda à proposta estadual. Mesmo
assim, havia os cursos de capacitação, e uma esperança de que um dia o
professor agisse de modo científico. Mesmo à custa de ofertas em dinheiro, como
tantos programas de capacitação acabam sendo.
De fato, os governos quiseram melhorar a educação. Não há
que se culparem, pelo menos os governos estaduais, pelos índices de desempenho
dos alunos. As escolas receberam equipamentos, mesmo os estudos científicos mostrando
que o impacto disso tudo sobre os resultados dos alunos é algo irrisório. Deve
ser sintomático que uma escola de Tamarana, humilde e interiorana, seja a
melhor escola pública do estado. Nada de acrílicos, computadores sobrando,
quadras imensas. Apenas a noção de que existe uma proposta curricular séria (ou
mais de uma, pois a lei não permite contradição entre o currículo federal e o
estadual), que deve ser seguida. E de que os achismos de professores devem
ficar restritos aos seus cadernos dos tempos de ditadura.
E, no entanto, ainda querem responsabilizar os governos
pelos índices de fracasso da educação brasileira. Lembro que, em 2009, mandei
flores e um cartão para a secretária de educação do município em que lecionava,
ao perceber que os alunos chegaram à quinta série com as habilidades esperadas
para a série. Não era mais preciso dizer aos alunos de onze anos que o S
intervocálico tem som de Z, ou que a conversa deles na hora do lanche é um
texto.
Nada disto chegou à capital do estado, que continua tecnicista,
anticientífica, feita de achismos e de pirotecnia propagandista. A proposta
curricular seguida na capital ainda é a lei 5692, da era Médici.
Aluno agride professor depois de ser repreendido em Bauru, SP
20/03/2012 10h20- Atualizado em 20/03/2012 20h30
Aluno agride professor depois de ser repreendido em Bauru, SP
O adolescente deu socos e chutes na vítima.
Quatro alunos também foram parar na delegacia por ameaçar colegas.
Do G1 Bauru e Marília

Na primeira, na Escola Franciso Alves Brisola, um aluno de dezessete anos agrediu um professor após ser repreendido por estar fora da sala de aula. O adolescente deu socos e chutes na vítima.
O jovem precisou ser contido por outras duas professoras que estavam no local. Ainda durante a confusão, ele chutou uma porta e quebrou uma cadeira.
Arma de brinquedoMais tarde, na Escola Estadual Luis Zuiani, quatro alunos entre 13 e 14 anos foram parar na delegacia após serem surpreendidos por duas inspetoras ameaçando colegas com uma pistola de brinquedo. Os estudantes foram ouvidos e liberados no DP, na presença dos pais, e o simulacro de arma foi apreendido.
Em nota, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo afirmou que lamenta a agressão cometida por um aluno contra o coordenador da Escola Estadual Francisco Alves Brizola. Diante do ocorrido, a secretaria informou ainda que o aluno ficará suspenso por três dias.
Em relação ao casa do Escola Estadual Doutor Luiz Zuiani, a Secretaria esclareceu que, diante do ocorrido, a polícia foi acionada e registrado Boletim de Ocorrência. Na segunda-feira, a direção convocou os pais dos alunos envolvidos para uma reunião, na qual foram discutidas medidas socioeducativas a fim de evitar a reincidência do caso..
quinta-feira, 10 de maio de 2012
terça-feira, 8 de maio de 2012
Professauros: suas avaliações
Celso Antunes, em um inocente livro sobre o que ele chama de "professauro". Sim, o professor formado nas épocas de ditadura e de obscurecimento do conhecimento científico. O professor de prova e trabalho, que usa a dinâmica apontada por Antunes no quadro acima. E que confunde anos de trabalho com experiência, mesmo ele tendo servido aos interesses da ditadura e ajudado a formar a população iletrada de hoje. Hoje, o professauro precisa preservar os seus parques, mesmo desobedecendo às diretrizes nacionais de educação formulada pelos governos democráticos.
Escolas curitibanas: a deformação das leis sobre avaliação
Como
é possível exigir das pessoas que elaboram regimentos e propostas curriculares
nas escolas um mínimo de conhecimento conceitual, se elas se dão o luxo de
desconhecerem as normas mais primárias da variante em que os escrevem?
Os
trechos abaixo são exemplos crassos:
(...)
foi autorizado a construção (...).
É
um momento em que o professor deve usar exclusivamente para práticas
relacionadas as suas atividades profissionais: correção de provas,
planejamento, elaboração de provas, atendimento de alunos e pais, entre outros.
A
cada caso que fuja da alçada do professor resolver em sala de aula, deverá ser
encaminhado, por escrito, à Equipe Pedagógica.
Fruto
de uma construção coletiva onde participaram direção, professores, funcionários
(...).
Não
há como negar que, temos alunos que chegam à escola sem a noção de limites e de
alguns valores fundamentais (...).
Os
atores envolvidos realmente demonstraram interesse, garra e motivação para
construir o nosso PPP. Quiseram, desde o início, constituir um documento nosso,
uma fonte de pesquisa e um norte para todas as nossas ações.
Como
subsídio, além do referencial bibliográfico, também serviram de apoio as versões
dos PPP’s anteriores.
Veiga
(2001) traz importantes contribuições sobre está temática (...).
Libâneo (2001, p. 125) aborda está temática ao destacar (...).
(...)
é importante termos presente quais ideais movem as pessoas (...).
Espera-se
ações docentes que visem o desenvolvimento intelectual (...).
É evidente a falta de habilidades de domínio da
variante padrão nas pessoas que escreveram os trechos acima. Mais que isso, é
possível perceber a pressa e o desarranjo que orientam a digitação dos mesmos.
O que se percebe aí é o aluno tradicional de escola pública resmungando por ter
que entregar uma pesquisa copiada de algum documento, e que faz aquilo com
pressa e desinteresse. Apenas para receber nota, o aluno; apenas para que uma
repartição qualquer afixe um carimbo, a escola.
Esse antigo aluno quase sem habilidades cita teóricos,
fala de leis, mas seria ingenuidade supor que ele compreenda o teor de tais
textos, se nem sequer percebe a relação dos predicativos com os sujeitos a que
se referem (“foi autorizado a construção”), no uso mais banal da língua
portuguesa. Nada de regência básica, mas deve ter feito provas sobre isso. Esse
antigo aluno ainda mantém em si os resquícios de uma variante inadequada ao
contexto (“demonstraram interesse, garra e motivação”). Nem passa pela cabeça
do pedagogo que no trecho existe uma gíria, e que ele está elaborando um
documento oficial. Esse mesmo antigo aluno de magistério, que certamente já deu
aulas para as séries iniciais, não percebe a relação entre o uso de acento e a
sílaba tônica da palavra (“aborda está temática”). No entanto, esse mesmo pedagogo acredita
que corrigir problemas de português é saber regras de ortografia.
Essa incompreensão de princípios de escrita
também se evidencia na incompreensão de princípios legais ou conceituais. Não
interessa a essas pessoas se os autores que elas citam na bibliografia de seus
textos têm um conceito de avaliação que está em desacordo com o que elas
escrevem, elas os usam apenas para conseguir a aprovação da autoridade. Logo em
seguida, negam os conceitos que defendem. Veja-se o que o Projeto
Político-pedagógico de um colégio de região nobre de
Curitiba afirma sobre avaliação:
Quanto à avaliação da aprendizagem, entendemos
que temos que buscar uma prática avaliativa que não tenha um fim em si mesma,
que não estabeleça como objetivo principal a classificação, a atribuição de
nota ao aluno, mas que seja um ponto de partida para a intervenção e
reformulação do processo de ensino. Conforme o disposto na Deliberação do CEE
nº 07/99 e em nosso Regimento Escolar, os professores utilizam instrumentos
diversificados, buscando valorizar a reflexão, a crítica, o estabelecimento de
relações entre os conteúdos trabalhados e não somente a memorização e repetição
da matéria estudada.
A ideia de uma avaliação como meio é evidente
entre quem escreve sobre educação. Percebe-se a colagem do que determina a
Deliberação 07/99, que nada mais é que uma aplicação do que determina a LDBEN
sobre o assunto. A diversidade de modos de avaliação, embora o termo
“instrumento” já signifique que a avaliação é algo passável, está afixada nas
leis, só que de um modo científico. Lá, essa ideia não tem a ingenuidade dos
docentes e dos pedagogos que a reduzem ao chavão prova, trabalho, atividade. No
texto da lei, avaliação se refere a modos científicos de se chegar a uma
aprendizagem significativa, e não apenas a uma nota. Trata-se de projetos,
produções dentro de gêneros definidos (não só na disciplina língua portuguesa).
Produzir conhecimento significativo.
O trecho citado acima é de uma das poucas
propostas curriculares, dentre as consultadas, que fazem referência às
diretrizes curriculares oficiais do estado e do país. Apenas para efeito
cosmético. Quando se atenta para o documento que orienta o sistema de avaliação
de um modo não mais científico e conceitual, mas unicamente regulamentar, o que
se percebe é a negação peremptória do que o documento escolar apregoa no trecho
citado acima. Não apenas sem referência no universo científico, mas inclusive
proibido pela mesma deliberação citada no documento:
Art.63 – Para a verificação da aprendizagem,
cada componente curricular deverá utilizar, em cada bimestre, instrumentos
diversificados onde:
I - as avaliações formais (provas e testes escritos) totalizem a nota 7,0 (sete vírgula zero) distribuída em no mínimo dois instrumentos no bimestre;
I - as avaliações formais (provas e testes escritos) totalizem a nota 7,0 (sete vírgula zero) distribuída em no mínimo dois instrumentos no bimestre;
II - as demais produções do aluno realizadas
com a orientação do professor como: pesquisas e trabalhos escritos,
apresentações individuais e/ou em grupo, produção de textos, relatórios e
outras atividades previstas no Plano de Trabalho Docente que tenham por
objetivo a sistematização da aprendizagem do aluno, diagnosticando o seu nível
de apropriação do conhecimento, totalizem a nota 3,0(três vírgula zero).
O artigo 24 da LDBEN é um dos documentos básicos que norteiam, com
o peso de lei federal, as possibilidades de um sistema de avaliação: “avaliação contínua e cumulativa do desempenho
do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e
dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais.” A
deliberação estadual sobre sistemas de avaliação tem o objetivo de divulgar,
para o professor paranaense, aquilo que a lei federal determina. Essa mesma
deliberação foi assunto dos programas de capacitação docente há cerca de dez
anos, e a escolas reformularam suas propostas para estarem adequadas. No
entanto, a proposta do colégio citada acima desconsidera a lei. De um modo
acintoso e exacerbado, pela certeza de que nenhuma autoridade a corrigirá. A
LDBEN deixa claro que o esforço da educação nacional deve se dirigir para a
superação do modelo quantitativo, algo também claro nas propostas paranaenses,
que aceitam a proposta nacional, “vista como mais adequada ao dia-a-dia da sala
de aula e como grande avanço em relação à avaliação tradicional, que se
restringe tão somente ao somativo ou classificatório.” A superação do
quantitativo é algo escarnecido pela proposta deste colégio. Na proposta de um outro colégio também tradicional, ela se
resume a uma incompreensão de sentido, típica da falta de habilidades de
leitura: “O sistema de avaliação é simples e objetivo, válido para todas as
disciplinas. A avaliação de cada bimestre terá valor 5,0. As atividades valem
2,0 pontos e o trabalho valerá 3,0 pontos.” Tal proposta poderia representar somente um problema de incompreensão do
sentido do que o artigo 24 dispõe, mas ela vai além. Ou seja, o fato de que a LDBEN proíba a
existência de provas e testes que valham a maioria da nota não significa que
elas possam valer a metade da mesma. O texto da lei fala em “prevalência”, e
não em igualdade de valores. Que uma prova bimestral valha 5,0 pontos é uma
estratégia para que o professor acomodado reduza seu sistema de avaliação ao
mínimo de registros possível. Mais do que apenas reduzir, a proposta a encaixa
em três menções. Mais do que isso, faz dessas menções apenas a confirmação
inapelável de que os autores dessas propostas não conhecem os autores citados
nas suas bibliografias, nem as leis nacionais. Parece motivo de riso que uma
proposta chame de “avaliação formal” aquilo que pedagogos como Celso
Vasconcellos e Júlio Furtado nem sequer chamam de avaliação, e que boa parte
deles chama de “avaliação entre aspas”, que faz pensar exatamente no pensamento
reducionista e sem base conceitual que levou o autor da proposta a usar tal
expressão para se referir à prova. Reducionista, manipuladora, contra a lei
federal. Sem base científica, feita para a década de 70, para a escola
tradicional e tecnicista da ditadura militar. A opinião sem fundamento dos
generais hoje é a opinião reducionista das pedagogas que nem aprenderam a
escrever. E passa a ser a visão unilateral do aluno, como o de outra escola, vizinha das demais aqui citadas, na qual o aluno só reconhece como
meios de avaliação aqueles que seu regimento determina. Nele, as atividades que
a LDBEN recomenda como “prevalência” apenas existem como uma mistificação
chamada de “atividade diferenciada”, que o aluno não vê como avaliação nem como
trabalho. Aqui, a influência de uma comunidade escolar mal informada gera as
aberrações sem valor conceitual.
Chama a atenção o uso infantiloide da palavra “trabalho” nessas
propostas. Faz pensar no aluno de ensino básico, que passou a chamar por esse
nome não a sua ação como aluno, diária, mas apenas alguma coisa a ser feita
fora do espaço escolar, normalmente cópia de alguma coisa, e que não representa
nenhum texto definido: não é resumo, nem relatório, nem resenha, mas essa cópia
garante ao aluno os pontos residuais que lhe farão chegar à nota, caso fracasse
nas risíveis “avaliações formais”, expressão que indica a falta de critérios ou
de uma “forma” na execução das demais tarefas. Grosso modo, querem dizer: “não
interessa quem fez, desde que o professor tenha isso em mãos para dar nota.”
Não são atividades processuais, desenvolvidas na rotina escolar, tal como a lei
apregoa.
Esse abandono das leis que orientam a avaliação, nas escolas
curitibanas, é uma atitude endossada pelas autoridades. Esse endosso garante
que uma proposta absurda, como a de se fazerem provas valendo 7,0 pontos, seja
aceita e praticada por um corpo docente composto por dezenas de professores.
Deve ser por isto que soa tão ridículo quando essas propostas apregoam ser o
resultado de um trabalho coletivo. Imoral, ilegal, escrita como se cada aluno
de ensino fundamental tivesse se sentado na cadeira da pedagoga, cada uma
dessas propostas é o resultado da visão distorcida que cada docente carrega
consigo, e que representa apenas um modo facilitador de se poupar o trabalho de
uma avaliação verdadeira, como está na lei e nos teóricos. Cada um deles a
escreveria com esse mesmo português de adolescente apressado dos trechos acima,
e que, na hora de dizer o que acha que deve ser mudado na escola, pede um
lanche mais barato. Querem a década de 70 (ou de 7,0) de volta, e não morrem se antes não o conseguirem.
Assinar:
Postagens (Atom)